Sonho lúcido
O sonho lúcido e a experiência extracorpórea e apesar de ocorrerem durante o sono são fenômenos considerados distintos. O sonho lúcido é um fenômeno entendido como percepção do sonho durante o sono, onde o indivíduo apresenta algum grau de entendimento ou consciência enquanto está sonhando, seja perceber que aquilo não está ocorrendo na vida real, seja para praticar habilidades não-humanas, reduzir ocorrência de pesadelos, solucionar problemas, enfim, controlar seu sonho. Essa sensação descrita existe, é muito comum e foi comprovada cientificamente por volta de 1975. O sonho lúcido, assim como qualquer outro sonho, acontece durante o sono REM, fase marcada pelo movimento rápido do olho e intensa atividade cerebral. Trabalhos realizados com eletroencefalografia (EEG) mostraram que as frequências predominantes durante um sonho lúcido estão entre 25–50 Hz, tais frequências relacionadas ao estado de vigília quando estamos acordados realizando experiências espaciais e movimento, o que demonstra que a intensa atividade cerebral está tentando "simular" situações em que vivemos quando acordados. Além disso, um interessante estudo mostrou que é possível indivíduos em estado de sono lúcido se comunicarem com o mundo exterior em tempo real. Sim, isso pode ser possível. O trabalho foi realizado com 36 indivíduos que possuíam a habilidade de sonhar de forma lúcida. Através de dados de EEG e movimento ocular, os pesquisadores constatavam se os indivíduos estavam na fase profunda do sono REM e interagiam com eles através de luzes, tato e perguntas verbais, como operações matemáticas simples, a contagem de luzes e os contatos que eles sentiram. As perguntas eram respondidas pelos indivíduos com a contração dos músculos faciais durante o sono. O sonho lúcido apesar de ser uma sensação espontânea, pode ser induzida conscientemente. Mas como podemos fazer isso voluntariamente? Uma das técnicas mais utilizadas nos estudos para induzir os sonhos lúcidos é a Mnemonic Induction of Lucid Dreams (MILD). A MILD consiste em tentar lembrar de sonhos anteriores e localizar elementos que fazem parte de um contexto irreal, sejam objetos inusitados ou criaturas fantásticas. Assim, sempre que estiver sonhando e perceber a presença de um desses elementos, imediatamente o voluntário passará a ter lucidez no sonho. Uma espécie de "diário do sonho" pode ajudar nessa tarefa. Além disso, também são praticados testes de realidade durante o dia, onde os indivíduos deverão se questionar se estão de fato acordados ou sonhando. Essa prática com frequência faz com que você faça os mesmo questionamentos durante o sonho, identificando que aquela experiência não faz parte da realidade. Então se você realmente deseja viver experiências relacionadas ao sonho lúcido como Adele faz na série, você tem que praticar muito e ser persistente! Mas as experiências extracorpóreas que alguns personagens da trama realizam, também é possível treinar e realizar?
Experiência extracorpórea
Já a experiência extracorpórea, popularmente conhecida como "projeção astral", é a capacidade de projetar sua consciência para fora de seu corpo físico e visitar outros lugares sem que seja percebido, podendo até mesmo visualizar o corpo físico adormecido. Apesar de ser algo tão extraordinário digno de uma ficção como na série "por trás de seus olhos", muitas pessoas relatam essa experiência com certa frequência. Um trabalho realizado com Functional Magnetic Resonance (fMRI) em indivíduos que se dizem capazes de realizar a experiência extracorpórea, mostrou uma grande inibição do córtex visual, enquanto diversas áreas associadas a imagens cinestésicas do lóbulo cerebral esquerdo estava bastante ativado (Imagem a direita). A cinestesia é a percepção do peso e posição do corpo e movimento, estando intimamente relacionada com nossa interação com o ambiente externo. Dessa forma, isso pode explicar a sensação de que estamos interagindo com o ambiente mesmo estando dormindo, como se tivéssemos "fora do corpo". Ainda não se sabe que tipo de mecanismos relacionados ao sono podem gerar uma experiência extracorpórea. Porém, já se sabe que situações como traumas cerebrais, privação sensorial, e experiências traumáticas como a experiência de quase morte quase-morte (EQM), podem gerar essa sensação extracorpórea. Além disso, alguns trabalhos mostram que a utilização de substâncias alucinógenas como dimetiltriptamina (DMT) presente em ervas como a Ayahuasca podem provocar experiência extracorpórea, e inclusive, pode ser utilizada como modelo adequado de indução de EQMs em laboratório para estudos de consciência em humanos. Sabendo disso, mesmo havendo apenas poucos experimentos sobre o assunto, acredita-se que as experiências extracorpóreas são um tipo de alucinação, desencadeada por algum mecanismo neurológico que causa essa sensação que por sua vez não é condizente com a realidade.
Como vimos, a ciência se mostra até o momento mais a favor dos sonhos lúcidos do que a experiência extracorpórea. Apesar de eu ter resumido os principais fatos da série no início deste blog , a trama possui um roteiro que prende e é cheio de surpresas e reviravoltas, vale a pena assistir. E sobre experiências extracorpóreas e sonhos lúcidos como é retratado na série, resta-nos deixar essa tarefa para a Adele, que pelo visto não sabe fazer apenas isso muito bem, mas como muitas outras coisas que você só descobrirá assistindo! Assista o trailer abaixo:
Referências:
Konkoly, Karen R., et al. "Real-time dialogue between experimenters and dreamers during REM sleep." Current Biology 31.7 (2021): 1417-1427.
Van Heugten-van der Kloet, Dalena, et al. "Out-of-body experience in virtual reality induces acute dissociation." Psychology of Consciousness: Theory, Research, and Practice 5.4 (2018): 346.
Smith, Andra M., and Claude Messier. "Voluntary out-of-body experience: an fMRI study." Frontiers in human neuroscience 8 (2014): 70.
NEUHÄUSLER, Annabelle; SCHREDL, Michael; GÖRITZ, Anja S. General knowledge about lucid dreaming and lucid dream induction techniques: an online study. Int. J. Dream Res, v. 11, p. 179-185, 2018.
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SCHREDL, Michael; ERLACHER, Daniel. Lucid dreaming frequency and personality. Personality and Individual Differences, v. 37, n. 7, p. 1463-1473, 2004.
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