Olá, tudo bem? O assunto de hoje tem se destacado nos meios de comunicação, mas está presente em nossa sociedade há muito tempo... Desde sua origem para ser sincera, na colonização do Brasil. É... hoje vamos falar sobre racismo.
E começo esse blog, perguntando... O que é racismo? Segundo o dicionário Aurélio, o racismo é definido como “preconceito e discriminação direcionados a quem possui uma raça ou etnia diferente, geralmente se refere à segregação racial. Comportamento hostil dirigido às pessoas ou aos grupos sociais que pertencem a outras raças e/ou etnias.” Bethencourt, 2018, o define como “atribuição a determinados grupos étnicos de características físicas e/ou mentais, reais ou imaginárias, que seriam supostamente transmitidas de geração em geração.”LIMA et al, 2019). Eu prefiro o segundo conceito, e você? Me parece mais completo, sei lá... E quando e como o racismo começou?
Pode-se afirmar, sem medo de errar que o racismo no Brasil se iniciou com a formação da sociedade brasileira (FERREIRA et al.,2018). A partir do momento em que se tentou “educar” os índios e com a vinda obrigatória de pessoas que viviam na África. Essas pessoas possuíam uma cultura e território próprios, e com a chegada do "Novo Mundo" foram impostos a um processo de perda da sua identidade e passaram a ser tratados como mercadorias e não humanos (ALBUQUERQUE, 2016).
Devemos salientar que o racismo não acontece apenas contra a população negra, mas é dada a ela a posição constante de alvo, por conta de contextos presentes no processo de escravidão. A eles foram destinados trabalhos obrigatórios em diversas funções tanto dentro da casa grande, como babás, amas de leite, nos serviços domésticos e como móveis da casa.. Você conhece a origem da palavra criado-mudo? Não? Dá um Google aí!... como também fora dela, nos serviços do campo e outros serviços vinculados aos interesses de enriquecimento e regalias do homem branco (ALBUQUERQUE, 2016).
Em todos os ambientes, as condições de sobrevivência impostas aos escravos foram as piores possíveis e duraram quase 400 anos, sendo o Brasil o último país das Américas a abolir a escravidão (ANNA E CAPUTO, 2018; AGOSTINI, 2016), já que os escravos eram a força motriz da sociedade. Dessa forma, o racismo teve como base os princípios sociais, políticos, culturais e capitalistas que mobilizavam a sociedade brasileira de outrora e que perduram até hoje de uma forma tanto estrutural (ALMEIDA, 2019, LIMA et al., 2019) como mostra a ilustração feita por AD Júnior, quanto recreativa (MOREIRA, 2019).
E quais foram / são os efeitos do racismo (que passou a ser crime!) na sociedade? Simples, a gênese e a manutenção das desigualdades, em todas as esferas. O racismo impossibilitou e hoje ainda cria grandes barreiras na participação do povo negro em espaços importantes na economia, na política e no meio acadêmico, por exemplo (LIMA, 2019; ALBUQUERQUE, 2016). E se há pouca representatividade nessas e em outras áreas, você acredita que haverá grandes mudanças sociais, econômicas e políticas para as pessoas negras, ainda que essas sejam a maior parte da população?
O que a neurociências fala a respeito do racismo? Será que existe algum efeito biológico para quem sofre o racismo? Será que eles apontam algo sobre quem pratica o racismo? O racismo é fruto de fator biológico entre as diferentes etnias?
Sobre essa última pergunta, você deve estar se perguntando em que ano estou?! Pois, o ano de 2020 nos enche de surpresas desagradáveis e uma delas é esse tipo de pensamento atrasado que ainda surge na nossa sociedade. Tais ideias foram originadas na Europa para serem utilizadas como um instrumento de combate contra movimentos que lutavam por igualdade (BETHENCOURT, 2018) e há muito e muito e muito tempo essa teoria caiu por terra.
E sobre quem pratica o racismo? Um estudo realizado em 2016 definiu empatia como capacidade que um espectador possui de reconhecer um indivíduo como semelhante, sendo essa capacidade encontrada em animais humanos e não humanos. Os autores dessa pesquisa apresentam a empatia dividida em dois componentes, a empatia cognitiva e a empatia afetiva.
A primeira se caracteriza pelo processo de compreensão da perspectiva de outra pessoa, o que envolve níveis de consciência. Já a segunda implica na capacidade de responder emocionalmente ao estado afetivo dos outros, essa é mais automática e com menor nível de consciência, na maior parte das vezes. Nos seres humanos, as resposta empáticas sofrem a influência de variáveis interpessoais e contextos sociais dentro e fora do grupo e é embasado em diferenças raciais (BERLINGERI ET AL., 2016)
Os pesquisadores tiveram como objetivo analisar as bases anatômicas e funcionais envolvidas em respostas empáticas à pessoas brancas e negras em um contexto doloroso e um não doloroso. Para isso, 12 homens brancos responderam a uma escala de autoavaliação de medidas de racismo explícitos e outro teste para avaliar os preconceitos raciais implícitos direcionados ao povo africano ou caucasiano. Após essas avaliações, a amostra foi submetida a sessões de fMRI, enquanto houve a exposição de vídeos apresentando atores (brancos e negros) com respostas faciais neutras ou de dor durante situações dolorosas ou não. Os participantes julgaram o nível de dor do ator, classificando-a de 0-3 (BERLINGERI et al., 2016).
Os resultados dos testes mostraram que a amostra apresentava traços racistas implícitos significativos, enquanto os traços explícitos foram inexistentes. O julgamento da amostra da dor dos atores africanos foi mais lento quando comparado com os atores brancos, aproximadamente 100 ms. Não houve diferença entre as raças durante a condição neutra, ou seja, sem estímulo nocivo. A conclusão do estudo sugere a existência de dois sistemas racionais, o primeiro rápido e automático embasado no conhecimento perceptivo e conceitual, propenso aos preconceitos/racismo e associado anatomicamente com estruturas do sistema límbico. O segundo sistema caracterizado pelo raciocínio controlado e demorado, baseado na capacidade de inibir impressões iniciais para tomar decisões racionais imparciais e se associa com a atividade do córtex pré-frontal (BERLINGERI et al., 2016).
Outro estudo utilizou a realidade virtual para analisar o racismo fazendo a amostra experimentar virtualmente corpos negros ou brancos durante uma aula virtual de Tai Chi, com um professor asiático ou europeu, caucasiano. Os resultados mostraram que as propriedades do corpo (gênero, características estruturais ou a idade) não afetaram os participantes. Contudo, a incorporação de pessoas brancas em um corpo virtual negro diminuiu, por pelo menos uma semana, o racismo implícito e tais resultados estiveram presentes já na primeira exposição ao ambiente virtual (BANKOU et al., 2016).
Note que ambos os estudos foram realizados em pessoas adultas em que todo um contexto social, político, econômico e cultural já estava presente. Logo, eles não justificam a presença do racismo com seus resultados, eles estudam seus efeitos. E os resultados mostram que há possibilidade de mudança no cenário (Será que o desejo de mudança é o que falta?!).
Isso me faz questionar quais resultados seriam encontrados em estudos realizados com crianças educadas em uma comunidade diversa e igualitária? Será que o julgamento de negros como não seres- humanos, ou de raça inferior, lançados durante a escravidão perdura até hoje, contudo mascarado? Será que é devido a isso que a escuta de suas pautas são, constantemente, negadas ou desacreditadas? Fica a reflexão!!!
Como fica quem sofre o racismo ou qualquer outro tipo preconceito? Um estudo teve como objetivo examinar se os estereótipos negativos de grupos sociais podem alterar a forma como o cérebro processa recompensas, modificando a forma como incentivos são processados no ambiente. Para isso a ressonância funcional magnética foi utilizada em uma amostra de imigrantes mexicanos submetidos a estereótipos negativos e não submetidos. Os resultados encontrados fornecem evidências de que a exposição a estereótipos negativos sobre um grupo pode transbordar e influenciar o processamento neural de incentivos e que tal fato pode se relacionar com desempenho no trabalho, depressão, dependências químicas e estados de saúde (WELBORN et al., 2020).
Como se deve combater o racismo? Bom, eu desconheço qualquer melhoria de desigualdade que não seja pautada na educação, conscientização, escuta da outra parte e ação. Os movimentos de resistência as desigualdade estão presentes desde o Brasil escravocrata, as comunidades quilombolas são um exemplo disso (Deixo como sugestão o documentário " Guerras do Brasil.doc" da Netflix). E ainda que nem todos estejam preparados para essa conversa... Se ligue nas dicas de leitura que podem te ajudar a pensar melhor sobre o racismo e na playlist. Até mais!
Referências:
AGOSTINI, Camilla (Ed.). Objetos da Escravidão: Abordagens sobre a cultura material da escravidão e seu legado. Editora 7Letras (Viveiros de Castro Editora LTDA-ME), 2016.
ALBUQUERQUE, Wlamyra Ribeiro de. Uma história do negro no Brasil. Salvador: Centro de Estudos Afro-Orientais; Brasília: Fundação Cultural Palmares, 2016.
ALMEIDA, Silvio. Racismo estrutural. Pólen Produção Editorial LTDA, 2019.
BANAKOU, Domna; HANUMANTHU, Parasuram D.; SLATER, Mel. Virtual embodiment of white people in a black virtual body leads to a sustained reduction in their implicit racial bias. Frontiers in human neuroscience, v. 10, p. 601, 2016.
BERLINGERI, Manuela et al. Guess who’s coming to dinner: Brain signatures of racially biased and politically correct behaviors. Neuroscience, v. 332, p. 231-241, 2016.
FERREIRA, Jair Francelino. CAVALCANTE, Raphael; ESTRELA, Clarissa (Coord.). Repertório bibliográfico sobre a condição do negro no Brasil. Brasília, DF: Edições Câmara, 2017. p. 12. Revista Bibliomar, v. 16, n. 2, p. 55-56, 2018.
LIMA, Emanuel Fonseca et al. (Ed.). Ensaios sobre racismos: pensamentos de fronteira. Balão Editorial, 2019.
MOREIRA, Adilson. Racismo recreativo. Pólen Produção Editorial LTDA, 2019.
WELBORN, B. Locke; HONG, Youngki; RATNER, Kyle G. Exposure to negative stereotypes influences representations of monetary incentives in the nucleus accumbens. Social cognitive and affective neuroscience, v. 15, n. 3, p. 347-358, 2020.
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