Recentemente, discutimos aqui no nosso blog como que a atividade de uma região do cérebro chamada córtex pré-frontal medial (mPFC) estaria relacionada com sintomas positivos como alucinações em pacientes com esquizofrenia. Naquele estudo, vimos que os pesquisadores utilizaram NIRS como técnica para estudar o funcionamento da atividade hemodinâmica dessa região do cérebro, enquanto os pacientes eram mantidos em estado de repouso, e que eles observaram uma menor atividade do mPFC nestes pacientes comparados aos controles saudáveis. O mPFC é um dos principais componentes do que chamamos “rede de estado de repouso” (resting state network), uma circuitaria do cérebro que fica mais ativa quando deixamos nosso pensamento à deriva. Ele também tem sido relacionado com o senso de agência e monitoramento sobre a realidade pelo cérebro, e a diminuição de sua atividade foi relacionada com alucinações persistentes nos pacientes. Com o estudo, os pesquisadores sugerem uma relação finalmente entre os achados neurofisiológicos e a sintomatologia da condição psiquiátrica destes indivíduos.
Outros grupos têm utilizado a mesma técnica para avaliar domínios diferentes da esquizofrenia. Um grupo de pesquisadores japoneses, ligados à Tottori University Faculty of Medicine, publicou um artigo em 2017 na Nature Neuroscience mostrando uma associação entre o funcionamento de um circuito neural que envolve os lobos frontal e temporal com habilidades cognitivas em sujeitos com esquizofrenia.
Os déficits cognitivos são reconhecidos como fatores centrais na esquizofrenia, constituindo um dos principais motivos pelos quais a inserção após tratamento destes indivíduos na vida social comum é tão difícil e, geralmente, malsucedida. Não somente aspectos sociais da cognição destes indivíduos está prejudicada, mas as próprias funções cognitivas como atenção, memória de trabalho, sua velocidade de processamento de informação, e até mesmo sua memória episódica estão comprometidas. A falta de tratamento para esses déficits cognitivos faz com que mais de 80% destes indivíduos continuem desempregados, e menos de 30% deles consegue viver a vida de forma independente. Mesmo com as tentativas de cunho neuropsicológico para a reabilitação das funções cognitivas destes pacientes, seu impacto ainda não é completamente satisfatório.
Em vista de que o prejuízo social destes indivíduos está intimamente relacionado com o déficit cognitivo associado à esquizofrenia, os pesquisadores decidiram avaliar se a atividade do córtex pré-frontal relacionada à memória de trabalho serviria como um bom marcador para o desenvolvimento terapêutico de pacientes esquizofrênicos, comparados a controles saudáveis – e os seus achados corroboram com sua hipótese. Mais especificamente, a atividade de regiões como o córtex pré-frontal dorsolateral (DLPFC) e o córtex frontal polar (FPC) mostraram correlações com a performance nos testes de avaliação da memória de trabalho aplicados pelos pesquisadores.
Novos estudos podem aprofundar a relação entre intervenções psicoterapêuticas com foco no desenvolvimento da memória de trabalho, avaliando seu impacto sobre a atividade hemodinâmica do DLPFC e do FPC, a fim de entender melhor como que abordagens comportamentais influenciam a atividade cerebral destes pacientes e vice-versa. Além disso, estabelecer relações entre a atividade nessas áreas, desempenho cognitivo, e atividade no mPFC como apontado pelo outro estudo que citamos no começo deste artigo pode oferecer um entendimento interessante sobre as relações entre memória de trabalho, monitoramento da realidade e surgimento de sintomas positivos na esquizofrenia.
Fonte: Pu, S., Nakagome, K., Itakura, M. et al. Association of fronto-temporal function with cognitive ability in schizophrenia. Sci Rep 7, 42858 (2017). https://doi.org/10.1038/srep42858
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