O debate em torno da maioridade penal é repleto de polêmicas e argumentos com fundamentações frágeis. Essa discussão ganhou força nos últimos anos, em vista da visibilidade dada ao crescente número de adolescentes presos por envolvidos no crime organizado, tráfico de drogas e/ou crimes violentos, que têm impulsionado o debate e pressão políticas pela diminuição da maioridade penal. Nesse sentido, criou-se e alimentou-se um senso comum de que adolescentes abaixo de 18 anos cometem muitos crimes bárbaros, como homicídios e latrocínios. No entanto, alguns pontos precisam ser destacado sobre nesse debate: o sensacionalismo que há sobre o tema e que impulsiona a criação de um senso comum baseado em distorção da realidade; os interesses por trás da diminuição da maioridade penal; o desconhecimento dos dados reais sobre criminalidade e motivos de reclusão de menores; e a notória ausência do conhecimento científico no referido debate.Um dos principais argumentos utilizados pelos políticos e instituições que defendem a redução da maioridade penal é o crescente cometimento de crimes violentos por menores. De fato, há um crescente número de menores sendo apreendidos ao longo dos últimos 20 anos. De acordo com o 12º Anuário Brasileiro de segurança púbica, entre 1996 e 2016, o número de adolescentes cumprindo medidas socioeducativas mais do que sextuplicou. Dentre as maiores motivações para as apreensões está o roubo (46,6%), seguido do tráfico de drogas (22,5%). De acordo com instituto “Sou da Paz”, se considerarmos a realidade de estado de São Paulo (Brasil), apenas 1,6% dos jovens apreendidos no ano de 2018 cometeram crimes violentos, como latrocínios, homicídios, sequestro ou estupro. A pesquisa revela, ainda, que mais da metade das apreensões foi motivada por tráfico de drogas (51,5%). Considerando esses, dados, uma das principais motivações apresentadas em defesa da maioridade penal parece frágil.
Além dos dados carcerários, é importante que se leve em consideração os aspectos psicológicos, biológicos e sociais ao qual esse debate está imerso. Como já vimos anteriormente, o processo de maturação cerebral é contínuo ao longo de muitos anos de vida. Nesse contexto, o principal debate está em torno das regiões cerebrais em se concentram as habilidades cognitivas responsáveis pelas tomadas de decisão, como é o caso da região frontal. Além disso, o próprio desenvolvimento da inteligência parece estar associado a espessura cerebral . Outros estudos vêm mostrando que o cérebro humano difere em tamanho e conectividade ao longo das idades. Esses achados implicam dizer que a maturidade social também é diferente ao longo das idades.
Nesse contexto, diminuição da maioridade penal, em termos práticos, significaria responsabilizar indivíduos que ainda estão em fases ainda mais prematuras de desenvolvimento cerebral e não necessariamente estaria ligado a diminuição da violência. Vale ressaltar, ainda, que em países com alto grau de desigualdades sociais, essas diferenças maturais tende a ser alavancadas pela notável diferença existente ligada ao acesso a bens essenciais como saneamento básico, alimentação saudável e educação de qualidade. Por fim, a “escolha” por caminhos menos “inteligentes”, como a violência, é o reflexo da impossibilidade imposta pelo sistema de acessar melhores condições de vida e das escolhas feitas por terceiros para guiar os destinos dos mais (ainda) imaturos.
Referências:
Fórum Nacional de Segurança Pública (2018). 12º Anuário Brasileiro de Segurança Púbica. forumseguranca.org.br Greenstein et al. (2006). Intellectual ability and cortical development in children and adolescents. Nature. Doi: 10.1038/nature04513 The content published here is the exclusive responsibility of the authors.