Linguagem e processamento neural

Monday, 08 de February de 2021
    A neurociência vem buscando explicar como se acomodam nossas redes neurais, à medida que os comportamentos respondem evolutivamente. Em paralelo, temos os estudos de Luria criador da a neuropsicologia, que defende a linguagem como responsável pelo desenvolvimento de funções psicológicas superiores (redes neurais), que faz a mediação entre o contexto sócio-cultural e o nosso corpo biológico.

     Luria informa que a função cerebral da linguagem não pode ser entendida uma área em particular, passando a ser entendida como um sistema funcional completo e complexo, sem reduzir uma atividade cognitiva complexa a uma ou poucos agrupamentos neuronais específicos. Podemos compreender que a teoria de Luria reforça que a medida que a comunicação se modifica, o “nosso cérebro se molda”.

       O psicólogo Geofrey Miller afirmou em seu livro The Mating Mind (2000), que as capacidades humanas evoluem por aspectos necessários à sobrevivência em cada época e, ao longo dessa evolução, essas capacidades vão se tornando inscritas em nosso código genético. Disse que nossos antepassados, por exemplo, só precisavam de alguns milhares de palavras para construírem-se gramaticalmente, considerando a linguagem como uma das inscrições do nosso DNA.

     O mesmo repertório evolutivo acontece com a programação das nossas células neurais, onde estudos sobre o processamento cerebral mostram que os circuitos neurais formam um modelo de pré ativação semântica (priming) da linguagem, que Luria considerou como o processo que intermedeia as relações entre cérebro e cultura (dinâmicas intelectuais e culturais). A medida que novas informações vão sendo compreendidas pelo nosso SNC, vai acontecendo o amadurecimento cortical e é nessa dinâmica que percebemos desenvolvimento do pensamento se tornando mais organizado e a linguagem mais clara.

    Os primings são geradores de padrões da linguagem, que dão vida aos circuitos neurais, e se tornam facilitadores na execução e interpretação linguística. O sistema de signos por exemplo, é uma espécie de padrão para compreendermos melhor a linguagem e facilitar a comunicação. A teoria da consciência semiótica, impulsionada por Saussure e Peirce (sec XX), explica os aspectos que envolvem a compreensão dos signos na linguagem.

    Retornando aos conceitos da neuropsicologia, o processamento da linguagem se dá inicialmente pelo reconhecimento de formas (palavras ou imagens) que foram identificadas previamente, com a finalidade de facilitar a comunicação através de padrões. Para falarmos sobre a inserção da linguagem, precisamos compreender a teoria de Peirce, que explica que os signos resultam da interação entre significado (o conceito da coisa) e o significante (a imagem sonora da coisa) e que nenhuma relação consciência/ambiente (priming) é imediata, sendo interposta pelo que ocorre entre a elaboração e a ação propriamente esperada. A definição que a linguagem propõe, necessita de esquemas pré-definidos, que dão características às ideias ou aos objetos em si. Entretanto, existe uma arbitrariedade motivacional que compõe o sistema de signos, traduzindo as linguagens como um fruto de convenções que caracterizam um dos padrões sociais e culturais (linguísticos).

   - Então você quer dizer que o sistema de signos que compõem a linguagem será convencional, dada a imagem mental que o observador tem, através das suas experiências?

O caminho é por aí, entretanto Peirce nos mostra que o importante não é determinar o que compõe a subjetividade, mas se o pensamento aborda o significado de algo real, com a finalidade de evitar posições que podem dar ilusão a uma palavra. Os signos funcionam como produtores de novos objetos que manifestam e realizam a relação triádica.

    A teoria dos signos ajuda a compreender o novo modelo de linguagem (linguagem digital), que traz consigo uma reflexão sobre o molde do “novo cérebro” baseado em redes neurais de informações rápidas, aceleradas e possivelmente superficiais. Podemos compreender um tipo de processamento no “piloto automático”, com as informações pré prontas, de fácil e rápido acesso, na palma das mãos, a qualquer momento.

     Sabendo que a linguagem pode ser modificada a depender do tempo e espaço que é construída, podemos entender então que a rede neural pode ser modificada através dos símbolos que estão atrelados a linguagem de cada época?
Ao afirmar que as nossas experiências cotidianas formam um priming de atividades, podemos sim questionar a influência do comportamento linguístico moderno, atrelado as informações digitais numa sociedade das multitarefas, da aceleração e do imediatismo de informações.

    Excesso de informações que podem ser difusas e não embasadas em conceitos teórico-científicos, tendem a confundir a mente ou até abrir espaços para dissociar informações, como temos percebido no cenário político atual, visto que Maior coerência cerebral pode trazer benefícios para a vida do indivíduo.
Informações que são absorvidas e programadas em nosso cérebro, podem traçar padrões neurais (primings) patológicos. Por outro lado, a criação de novas expressões digitais e a facilidade de acesso à comunicação/ informação tendem a estimular a criatividade dos usuários das mídias digitais, considerando as linguagens culturais diferentes na transformação da mente.

     Estudos da neurociência comprovam que nosso cérebro tende a ficar satisfeito com recompensas imediatas, representados pelos circuitos cerebrais que os padrões sustentam a dispersão mental (Cosenza), a partir disso temos vieses cognitivos pré programados e em paralelo os primings neurais que socialmente tem sido representadas por comportamentos patológicos.
 

REFERÊNCIAS

COSENZA, Ramon; GUERRA, Leonor. Neurociência e educação. Artmed Editora, 2009.

PEIRCE, Charles S. Semiótica. 2 ed., São Paulo: Perspectiva, 1990. apud FERNANDES, José David Campos em Introdução à semiótica. Linguagens: usos e reflexões, v. 1, p. 159-185.

LURIA, Aleksandr Romanovich. The working brain: An introduction to neuropsychology. USA: Basic Books, 1976.

MILLER, Geoffrey. The mating mind: How sexual choice shaped the evolution of human nature. Anchor, 2011.



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Autor: Mab Abreu
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