Um dos principais objetivos das neurociências é entender como funciona o encéfalo de indivíduos que possuem alguma alteração em seu funcionamento, como por exemplo, pacientes com
Alzheimer,
Parkinson, Esclerose Múltipla ou Esquizofrenia. Através do entendimento dessas alterações, podemos compreender melhor como o encéfalo funciona normalmente, mas, de maior importância, como podemos ajudar estes indivíduos a ter maior qualidade de vida.
A esquizofrenia, em particular, é um transtorno de causa exata ainda não conhecida. Acredita-se que sua causa seja uma combinação de fatores genéticos e ambientais que influenciam a atividade, estrutura e química do cérebro. Ela é marcada por pensamentos que parecem descolar-se da realidade e por um comportamento desorganizado, que atrapalha os indivíduos em sua participação na sociedade. Ela também é muito estigmatizada como “loucura” por conta das alucinações, que podem estar presentes.
Uma forma de estudar os transtornos neurológicos e psiquiátricos como a esquizofrenia, é através de técnicas de imageamento cerebral. Recentemente, uma técnica tem se destacado e ajudado os pesquisadores a compreender melhor a dinâmica da atividade cerebral nestes pacientes: o
fNIRS (functional near-infrared spectroschopy). Já discutimos aqui em nosso blog
diversas aplicações desta técnica e no que ela é baseada, mas basicamente ela utiliza um tipo de luz capaz de penetrar no tecido cortical que tem alta afinidade para se ligar à hemoglobina, providenciando uma medida do consumo de oxigênio em diversas regiões do córtex cerebral durante a execução de alguma tarefa.
Quando estamos em estado de repouso, essa atividade também pode ser medida. O que os estudos mostram é que parece haver uma “rede de estado de repouso” (resting-state network) definida pelas regiões do cérebro mais ativas enquanto nosso pensamento está à deriva. Estas regiões incluem o córtex pré-frontal medial
mPFC, além do PCC/precúneo. Nelas, observa-se flutuações de baixa frequência no fluxo sanguíneo (na sigla em inglês ALFF – amplitude of low-frequency fluctuations) durante o estado de repouso.
Muitos estudos têm indicado um nível reduzido dessa amplitude de flutuações de baixa frequência no fluxo sanguíneo (ALFF) no mPFC de pacientes com esquizofrenia. No entanto, há inconsistências nesses achados quanto à relevância deste sinal em sua relação com sua manifestação sintomática. Em um estudo recentemente publicado na Nature Neuroscience, um grupo de pesquisadores japoneses liderado por Masaya Yanagi mostrou que essas alterações estariam associadas com alucinações auditivas persistentes em pacientes com esquizofrenia crônica. Outros estudos, ainda, mostram que o mPFC é uma região do cérebro envolvida no automonitoramento e no monitoramento do senso de agência e realidade, discriminando entre informações geradas pelo indivíduo ou externamente, pelo ambiente.
Combinado a isso, também foi mostrado que pacientes com sintomas positivos de esquizofrenia, como as alucinações, possuem uma maior atividade nos córtices sensoriais. Esses achados, em conjunto, sugerem que a hiperatividade dos córtices sensoriais, associados com a hipo-ativação do mPFC resultam em dificuldades em monitorar a realidade, levando a uma falha no reconhecimento de estímulos sensoriais como gerados pelo próprio indivíduo (e não externamente), e portanto, às alucinações típicas da esquizofrenia.
Estudos com estimulação cerebral podem ser uma abordagem interessante para seguir esta linha de pesquisa, como abordagem terapêutica. Será que a estimulação por
tDCS do mPFC ajuda a regular as experiências alucinatórias em pacientes com esquizofrenia? Isso poderia abrir um novo caminho na qualidade de vida destas pessoas!
Fonte:
Yanagi, M., Hosomi, F., Kawakubo, Y. et al. A decrease in spontaneous activity in medial prefrontal cortex is associated with sustained hallucinations in chronic schizophrenia: An NIRS study. Sci Rep 10, 9569 (2020). https://doi.org/10.1038/s41598-020-66560-2
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